14 de fevereiro de 2014

Santiago morreu


Santiago morreu. Não foi uma morte qualquer. Destas, que, depois de sete dias, já se apaga da memória displicentemente. Seu nome gravou-se, infeliz, numa oportunista produção política midiática. Ironia do destino, ser Santiago jornalista. Aliás, isso também foi muito oportuno. Talvez tenha sido a morte mais esperada e desejada do ano. Aliás, esperava-se por um Santiago, desde junho de 2013. Mas o tempo passava e uma desgraça assim – que pudesse ser usada estrategicamente – teimava em não acontecer. Pelo menos, do jeito que queriam. E quando menos esperavam, uma pirotecnia produziu um Santiago. Um rojão, um clarão de luz e a explosão de imagens e flashes. Santiago morreu. Uma desgraça. Algo irreparável.  Me sinto triste por ele. Pelos garotos presos e por sua juventude encarcerada. Lamento por esta tragédia. Vidas desperdiçadas. Os três. Infelizmente. A imagem de Santiago sendo atingido pelo rojão foi reproduzida exaustivamente. E repetidamente a mídia – esta mesma para a qual ele trabalhava – o matou para, no noticiário seguinte, ressuscitá-lo e, novamente, voltar a jogá-lo ao chão, em chamas. Sua cabeça ardeu, Santiago. E todos nós nos queimamos com você. A violência que o matou continua tentando assassinar, a todo custo, o desejo – também, ardente – de revolucionarmos este mundo. Há faíscas no ar. Em editorial, o jornal O Globo pediu mais severidade contra os manifestantes ditos “violentos” e explicações por parte do mandato do Deputado Marcelo Freixo, sobre a suposta prática de financiamento de “grupos violentos”. Ainda no editorial, a foto do José Mariano Beltrame. Mais severidade, conclamava o editorial. Total apoio ao governo Cabral e ao seu candidato Pezão. Santigo a sua morte serviu a eles. Que tragédia. Usam-na, sem qualquer tipo de pudor, para atingir a imagem do Freixo e, sobretudo, para criminalizar as manifestações. Usam-na, Santiago, para aprovar o Projeto de Lei do Senado n. 499, de 2013, onde três pessoas já conformam um “grupo terrorista”, cuja punição é reclusão de 5 a 15 anos de prisão! “Incitar o terrorismo” – e sabe-se lá que uso farão deste termo – pena: reclusão, de 3 a 8 anos.  Usam sua tragédia Santiago por uma questão política e eleitoreira. A imagem de sua desgraça virou estampa de campanha. Antes de você, jornalistas foram mortos. Depois de você, outros cairão. E para eles, possivelmente, não haverá, como houve para você, tantos choros e velas. Tantos flashes. E uma dezena de manifestantes foram mortos desde junho de 2013, no Brasil. O problema, Santiago, é que a morte deles não servia aos interesses políticos daqueles que lhe usam, agora. Por isso, o silêncio. Por isso, o rápido e estratégico esquecimento. Eu fico triste, sabe? Se não bastasse a perda irreparável de uma vida, vê-la sendo usada assim! Que violência! Santiago, sua morte nos força a pensar em muitas coisas. Há muitas pedras e perdas no meio do caminho. É verdade. Equívocos, tensões e flores, também. E eu fico pensando na insistência, no desejo de transformar este mundo e que tudo isso, Santiago, ainda é maior do que a violência que lhe queimou e que nos queima diariamente. Você morreu, a gente sabe, mas continua vivo. 

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