11 de fevereiro de 2014

A vergonha

                                       "Vamos festejar a violência"
(Renato Russo)

“Olho por olho, e o mundo acabará cego”
(Mahatma Gandhi)

A vergonha toma conta de meu rosto. Na internet, observo, ainda que olhar doa e plante tristezas em meu peito, um adolescente – negro, pobre e em situação de rua –preso a um poste através de um pedaço de bicicleta. Ele apanhou e foi capturado por um grupo de jovens “justiceiros”. Jovens classe média indignados com a violência no Aterro do Flamengo, Rio de Janeiro. Vejam: eles diziam lutar contra a violência! Há faíscas no ar. Um gosto ruim na boca. Que os meus olhos estivessem mentido, que fosse ficção. Ah, em meu silêncio eu pedi que fosse mentira. Uma montagem, como tantas outras. Mas não! Era mais verdade do que eu estava disposto a crer. É realidade, eu suspirei desenganado. Uma realidade dura de engolir, árida de experimentar, difícil de tentar entender. Fizeram justiça, alguém disse. Justiça? Escuto com dificuldade. Certas palavras agridem meu ouvido. Houve aplausos. Vivas. Uma comemoração. Minha cabeça dói. Pegaram um negro ladrão! Prenderam-no num improvisado pelourinho de cimento. É o seu castigo! É a sua punição! A âncora-personagem do telejornal comemorou. Em seu discurso o deleite de um clamor punitivo desavergonhado testando os limites do tolerável. Houve críticas, indignações e prisões. ‘Quero ver se fosse com você! Se ele te assaltasse!” Me cobri de vergonha. Eu queria poder dizer que é mentira, mas a verdade grita. Me cobri de vergonha. 

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