13 de janeiro de 2016

São Paulo e as bombas














A bomba explodiu
Eu queria correr,  fugir
Mas fiquei. Aturdido.
Meu corpo ainda dói.
Jogaram bombas em nós
E só queríamos gritar
E gritamos! De dor,  de raiva
A fumaça amarga subiu
Uma nuvem de veneno nos beijou
E no véu de estúpida violência
Entre bombas, cassetes
Manchetes tendenciosas
Catamos nossos cacos
Entre os restos do que não sobrou
Desta nossa democracia.
Vontade de rir,  mas até isso dói
Há tantas coisas entaladas na garganta.
A PM diz que fez valer a lei.  Ora!
Sua hipocrisia não nos espanta.
Haverão de curtir o fascismo no face
Em nossa face ensanguentada
Nos chamarão de baderneiros
E novamente atacados
Jogam bombas em nós
E eu que não estava em São Paulo
Daqui fui atingido.
Bombas explodem.
Querem nos calar.
Mas não há silêncio.


*imagem retira de reportagem do Portal Fórum. 


14 de fevereiro de 2014

Santiago morreu


Santiago morreu. Não foi uma morte qualquer. Destas, que, depois de sete dias, já se apaga da memória displicentemente. Seu nome gravou-se, infeliz, numa oportunista produção política midiática. Ironia do destino, ser Santiago jornalista. Aliás, isso também foi muito oportuno. Talvez tenha sido a morte mais esperada e desejada do ano. Aliás, esperava-se por um Santiago, desde junho de 2013. Mas o tempo passava e uma desgraça assim – que pudesse ser usada estrategicamente – teimava em não acontecer. Pelo menos, do jeito que queriam. E quando menos esperavam, uma pirotecnia produziu um Santiago. Um rojão, um clarão de luz e a explosão de imagens e flashes. Santiago morreu. Uma desgraça. Algo irreparável.  Me sinto triste por ele. Pelos garotos presos e por sua juventude encarcerada. Lamento por esta tragédia. Vidas desperdiçadas. Os três. Infelizmente. A imagem de Santiago sendo atingido pelo rojão foi reproduzida exaustivamente. E repetidamente a mídia – esta mesma para a qual ele trabalhava – o matou para, no noticiário seguinte, ressuscitá-lo e, novamente, voltar a jogá-lo ao chão, em chamas. Sua cabeça ardeu, Santiago. E todos nós nos queimamos com você. A violência que o matou continua tentando assassinar, a todo custo, o desejo – também, ardente – de revolucionarmos este mundo. Há faíscas no ar. Em editorial, o jornal O Globo pediu mais severidade contra os manifestantes ditos “violentos” e explicações por parte do mandato do Deputado Marcelo Freixo, sobre a suposta prática de financiamento de “grupos violentos”. Ainda no editorial, a foto do José Mariano Beltrame. Mais severidade, conclamava o editorial. Total apoio ao governo Cabral e ao seu candidato Pezão. Santigo a sua morte serviu a eles. Que tragédia. Usam-na, sem qualquer tipo de pudor, para atingir a imagem do Freixo e, sobretudo, para criminalizar as manifestações. Usam-na, Santiago, para aprovar o Projeto de Lei do Senado n. 499, de 2013, onde três pessoas já conformam um “grupo terrorista”, cuja punição é reclusão de 5 a 15 anos de prisão! “Incitar o terrorismo” – e sabe-se lá que uso farão deste termo – pena: reclusão, de 3 a 8 anos.  Usam sua tragédia Santiago por uma questão política e eleitoreira. A imagem de sua desgraça virou estampa de campanha. Antes de você, jornalistas foram mortos. Depois de você, outros cairão. E para eles, possivelmente, não haverá, como houve para você, tantos choros e velas. Tantos flashes. E uma dezena de manifestantes foram mortos desde junho de 2013, no Brasil. O problema, Santiago, é que a morte deles não servia aos interesses políticos daqueles que lhe usam, agora. Por isso, o silêncio. Por isso, o rápido e estratégico esquecimento. Eu fico triste, sabe? Se não bastasse a perda irreparável de uma vida, vê-la sendo usada assim! Que violência! Santiago, sua morte nos força a pensar em muitas coisas. Há muitas pedras e perdas no meio do caminho. É verdade. Equívocos, tensões e flores, também. E eu fico pensando na insistência, no desejo de transformar este mundo e que tudo isso, Santiago, ainda é maior do que a violência que lhe queimou e que nos queima diariamente. Você morreu, a gente sabe, mas continua vivo. 

11 de fevereiro de 2014

A vergonha

                                       "Vamos festejar a violência"
(Renato Russo)

“Olho por olho, e o mundo acabará cego”
(Mahatma Gandhi)

A vergonha toma conta de meu rosto. Na internet, observo, ainda que olhar doa e plante tristezas em meu peito, um adolescente – negro, pobre e em situação de rua –preso a um poste através de um pedaço de bicicleta. Ele apanhou e foi capturado por um grupo de jovens “justiceiros”. Jovens classe média indignados com a violência no Aterro do Flamengo, Rio de Janeiro. Vejam: eles diziam lutar contra a violência! Há faíscas no ar. Um gosto ruim na boca. Que os meus olhos estivessem mentido, que fosse ficção. Ah, em meu silêncio eu pedi que fosse mentira. Uma montagem, como tantas outras. Mas não! Era mais verdade do que eu estava disposto a crer. É realidade, eu suspirei desenganado. Uma realidade dura de engolir, árida de experimentar, difícil de tentar entender. Fizeram justiça, alguém disse. Justiça? Escuto com dificuldade. Certas palavras agridem meu ouvido. Houve aplausos. Vivas. Uma comemoração. Minha cabeça dói. Pegaram um negro ladrão! Prenderam-no num improvisado pelourinho de cimento. É o seu castigo! É a sua punição! A âncora-personagem do telejornal comemorou. Em seu discurso o deleite de um clamor punitivo desavergonhado testando os limites do tolerável. Houve críticas, indignações e prisões. ‘Quero ver se fosse com você! Se ele te assaltasse!” Me cobri de vergonha. Eu queria poder dizer que é mentira, mas a verdade grita. Me cobri de vergonha.