4 de dezembro de 2008

Artista de uma vida dolorida

Cruzar pelas ruas da cidade do Rio de Janeiro e ver alguém fazendo malabarismo no sinal (ou semáforo) não é algo raro, pelo contrário, já se tornou um acontecimento recorrente. Quando o verde fica vermelho e os carros param, meninos e homens, principalmente, correm para baixo dos sinais de trânsito: jogam bolas ao ar; equilibram latas enquanto dão saltos e fazem inúmeras acrobacias. Cada movimento harmoniza-se com cada objeto que voa ao céu e depois volta às mãos doídas daquele que magistralmente o lançou ao ar. Tudo sincronizado e repetido como numa orquestra. Antes que os motoristas mexam na embreagem e pisem no acelerador, o espetáculo já terminou e os seus artistas urbanos vão às janelas na esperança de verem os seus esforços minimamente recompensados. A realidade é dura e eles, mais do que ninguém, sabem disso. Não são poucas as janelas fechadas que não se abrem; as caras de mau humor e os palavrões, mas tudo bem, eles continuam a equilibrar bolas e a fazer um espetáculo particular embaixo de cada sinal. Para eles, o sinal sempre está vermelho, mas quando dão seu espetáculo, ele fica amarelo, e, às vezes, verde como a folha de uma árvore.
Estava passando pela praia de Botafogo no domingo a tarde e, ao cruzar a pista, vi a cena que me levou a escrever este pequeno e modesto texto, qual seja: um homem fazendo malabarismo em frente aos carros parados. Bem, até aqui não há novidade nenhuma em tal acontecimento, pelo contrário, mas então o que pode haver de novo? O que me chamou a atenção era que o homem possuía apenas um dos braços, o outro estava amputado. Mesmo sem ter as duas mãos, eu vi aquele estranho fazer malabarismo com pedaços de pau como poucos. Vi os seus olhos concentrados e cada movimento seu exprimindo-se da maneira sincronizada e precisa. Naquele curto espaço de tempo que cruzei a pista e me deparei com aquele artista de uma vida dolorida, não pude deixar de me espantar, não porque aquele homem faça o que faz com apenas um braço, mas porque muitos de nós somos incapazes de fazer a metade com os dois braços, mesmo tendo o sinal sempre verde em nossa frente.

7 comentários:

Rúbia Barros disse...

Gostei do teu canto,
passei só para dar uma espiada,
quem sabe não passo de novo?

Tudo de bom!

Rúbia Barros disse...

Há de ser bem vindo em meu canto, passe quando quiser, me acompanha, que te acompanho.


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Gostei das frases,Gandhi,King,além doas quadros,e a fotografia de Kevin Carter, Chocante!!!
vejo que além de aprendiz a poeta, é uma pessoa fascinada por história, como eu.

passarei mais vezes.

Uma ótima Semana.

Anônimo disse...

aqui em manaus...
se voce tem olhos bem atentos é possivel ainda recordar quando esses artistas começaram a povoar as ruas. no inicio..eram alguns venezuelanos e outros q falavam com a lingua enrolada, tinham roupas colorias meio puídas e soltavam fogo pela boca e conseguiam equilibrar bolinhas e varas..
..mas pra mim.. o que eu lembro mais..foi qnd vi um garotinha que tinha no maximo 7 anos.. o sinal ficou vermelho..e ele se chegou com o rosto sujo e os bracinhos magros, jogou as bolinhas pra cima.. todas cairam no chao.. ele mesmo assim nao desistiu..tentou de novo..e de novo.. e de novo..
e o sinal abriu..
preciso falar de tudo q senti naquele momento?

Olavo disse...

Passando para conhecer seu blog..belo texto..belo blog..Parabens.
abraços

Abraão Vitoriano disse...

Você revela-se numa mistura de sentimentos e sensações... eloqüência conhece bem você...rs
Abraços!

Ana Aitak disse...

Indiquei você pra receber um selinho (não o beijo rsrs).Se o quiser, pode vir buscar.

kiss

Jota Reis disse...

Muito bom.

O seu link já está no meu blog, meus parabéns.