Santiago
morreu. Não foi uma morte qualquer. Destas, que, depois de sete dias, já se
apaga da memória displicentemente. Seu nome gravou-se, infeliz, numa
oportunista produção política midiática. Ironia do destino, ser Santiago
jornalista. Aliás, isso também foi muito oportuno. Talvez tenha sido a morte
mais esperada e desejada do ano. Aliás, esperava-se por um Santiago, desde
junho de 2013. Mas o tempo passava e uma desgraça assim – que pudesse ser usada
estrategicamente – teimava em não acontecer. Pelo menos, do jeito que queriam.
E quando menos esperavam, uma pirotecnia produziu um Santiago. Um rojão, um
clarão de luz e a explosão de imagens e flashes. Santiago morreu. Uma desgraça.
Algo irreparável. Me sinto triste por
ele. Pelos garotos presos e por sua juventude encarcerada. Lamento por esta
tragédia. Vidas desperdiçadas. Os três. Infelizmente. A imagem de Santiago
sendo atingido pelo rojão foi reproduzida exaustivamente. E repetidamente a
mídia – esta mesma para a qual ele trabalhava – o matou para, no noticiário
seguinte, ressuscitá-lo e, novamente, voltar a jogá-lo ao chão, em chamas. Sua
cabeça ardeu, Santiago. E todos nós nos queimamos com você. A violência que o
matou continua tentando assassinar, a todo custo, o desejo – também, ardente –
de revolucionarmos este mundo. Há faíscas no ar. Em editorial, o jornal O Globo
pediu mais severidade contra os manifestantes ditos “violentos” e explicações
por parte do mandato do Deputado Marcelo Freixo, sobre a suposta prática de
financiamento de “grupos violentos”. Ainda no editorial, a foto do José Mariano
Beltrame. Mais severidade, conclamava o editorial. Total apoio ao governo
Cabral e ao seu candidato Pezão. Santigo a sua morte serviu a eles. Que
tragédia. Usam-na, sem qualquer tipo de pudor, para atingir a imagem do Freixo
e, sobretudo, para criminalizar as manifestações. Usam-na, Santiago, para
aprovar o Projeto de Lei do Senado n. 499, de 2013, onde três pessoas já
conformam um “grupo terrorista”, cuja punição é reclusão de 5 a 15 anos de
prisão! “Incitar o terrorismo” – e sabe-se lá que uso farão deste termo – pena:
reclusão, de 3 a 8 anos. Usam sua
tragédia Santiago por uma questão política e eleitoreira. A imagem de sua
desgraça virou estampa de campanha. Antes de você, jornalistas foram mortos.
Depois de você, outros cairão. E para eles, possivelmente, não haverá, como
houve para você, tantos choros e velas. Tantos flashes. E uma dezena de manifestantes
foram mortos desde junho de 2013, no Brasil. O problema, Santiago, é que a
morte deles não servia aos interesses políticos daqueles que lhe usam, agora.
Por isso, o silêncio. Por isso, o rápido e estratégico esquecimento. Eu fico
triste, sabe? Se não bastasse a perda irreparável de uma vida, vê-la sendo
usada assim! Que violência! Santiago, sua morte nos força a pensar em muitas
coisas. Há muitas pedras e perdas no meio do caminho. É verdade. Equívocos,
tensões e flores, também. E eu fico pensando na insistência, no desejo de
transformar este mundo e que tudo isso, Santiago, ainda é maior do que a
violência que lhe queimou e que nos queima diariamente. Você morreu, a gente
sabe, mas continua vivo.